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O primeiro submarino nuclear brasileiro, que deveria ficar pronto em 2029 – após diversos atrasos desde o seu início em 1979 –, pode ter a sua estreia mais uma vez postergada, agora com previsão para 2033.

O prazo, ainda não oficializado, mas já admitido como o mais realista, deve-se ao contingenciamento de verbas imposto pela Emenda Constitucional 95, que congelou inversões pelos próximos 20 anos. Com investimento total estimado em R$ 30 bilhões, portanto, a iniciativa deve também ser atingida pelo teto de gastos públicos.

Apesar do anticlímax, alguns benefícios relevantes advindos de pesquisa e desenvolvimento vinculados ao projeto já podem ser vislumbrados na engenharia brasileira e em setores como medicina, agricultura, climatologia, biologia, na própria indústria naval e na farmacologia. Nesse último campo, está em andamento a construção do primeiro reator multipropósito de grandes proporções no País para a produção de radiofármaco utilizado em exames de imagem e em radioterapia.

Ainda, as equipes envolvidas no processo dominaram, por exemplo, o ciclo do combustível nuclear e a propulsão, respectivamente primeira e segunda etapas do Programa de Desenvolvimento de Submarinos (Prosub). Nessas fases, obteve-se o gás hexafluoreto de urânio, principal insumo para a produção do combustível das usinas de Angra 1 e 2, antes importado.

O projeto é desenvolvido no Centro Tecnológico da Marinha, na Universidade de São Paulo (USP), em parceria com a Escola Politécnica da instituição (Poli), e no Centro Experimental Aramar, em Iperó, no interior paulista, onde está localizado o Laboratório de Geração Nucleoelétrica (Labgene). Lá está sendo montada uma planta do submarino, em tamanho real, prevista, anteriormente, para ser concluída em 2021. Esse piloto, em que são feitos testes, servirá de modelo para a produção das peças. Para que isso fosse possível, foi necessário parceria com dezenas de instituições e companhias nacionais, como a Atech, subsidiária da Empresa Brasileira de Aeronáutica (Embraer), o Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (Ipen) e a Comissão Nacional de Energia Nuclear (Cnem), que certifica tudo o que está sendo feito.

Tecnologia nacional e parcerias

Não é autorizado à Marinha a importação desses equipamentos por uma questão estratégica dos países. Praticamente tudo o que existe hoje dentro do submarino foi desenvolvido pela Marinha e construído pela indústria brasileira. Em termos de projeto, é 100% brasileiro”, explica o comandante do 8º Distrito Naval da Marinha, Antonio Carlos Soares Guerreiro, que recebeu do Sindicato dos Engenheiros no Estado de São Paulo (Seesp) o prêmio Personalidade da Tecnologia 2017 na categoria “Desenvolvimento sustentável”, em nome do almirante Eduardo Leal Ferreira. Ele explica que a propulsão só não é totalmente nacional porque alguns equipamentos, como pequenos motores elétricos, foram importados.

E é nessa parte que se emprega a engenharia nuclear. Em um submarino convencional, o eixo da hélice é turbinado por um motor elétrico, acionado por grandes baterias, que são recarregadas por geradores a diesel. Como esses funcionam por combustão, para ligar, é preciso ir de duas a três vezes à superfície aspirar ar. O nuclear também possui um motor elétrico, porém com turbinas a vapor, o qual é gerado pelo reator nuclear. O fato de não depender do ar para ligar reflete diretamente em sua autonomia: pode ficar meses debaixo d´água. No entanto, a fadiga e a alimentação da tripulação são componentes que impedem a permanência por períodos muito prolongados.

Em 2008, o Prosub ganhou novos recursos com a assinatura de um acordo com a França para a transferência de tecnologia à construção do casco e demais sistemas (terceira etapa). No pacote estão inclusos ainda quatro submarinos convencionais modelo Scorpene, base naval para o nuclear, mais dois estaleiros (de construção e de manutenção) – feitos no Complexo Naval de Itaguaí, no Rio de Janeiro.

O acordo possibilitou a capacitação de 50 engenheiros (da Marinha e de empresas privadas) às instalações da francesa Direction dês Constructions Navaleset Services (DCNS). “Ao retornarem, projetaram uma alteração do submarino convencional, que não existe no original francês. O nosso é jumborizado (processo em que a embarcação é aumentada), porque projetamos uma sessão intermediária”, revela Guerreiro.

É possível constatar essas características no primeiro submarino a ficar pronto, o Riachuelo, transferido nos dias 13 e 14 de janeiro último para montagem final na área de lançamento – que deve ocorrer no 2º semestre de 2018. Ele pesará 1.600 toneladas e navegará a uma velocidade média de 8 quilômetros por hora, menos que o nuclear, que pesará 6 mil toneladas e ultrapassará os 60km/h.

Cerca de 400 engenheiros atuam no programa, que totaliza uma equipe de 3 mil pessoas. Segundo Guerreiro, o objetivo do governo brasileiro é dar maior segurança à costa brasileira, à chamada Amazônia Azul, área oceânica de 4,5 milhões de km², rica em biodiversidade, por onde o País escoa 95% do seu comércio exterior e são extraídos mais de 90% do petróleo e gás.

Para Fuad Kassab, que integra o grupo de Controle e Automação do Departamento de Engenharia de Telecomunicações e Controle da Poli, o qual supervisiona o programa do submarino nuclear, não restam dúvidas quanto à sua importância. “Trata-se de um projeto muito relevante para o País sob vários aspectos. Não só na produção do radiofármaco, como de urânio enriquecido. Quem critica a energia nuclear geralmente está mal-informado. Hoje é absolutamente segura e deve fazer parte da matriz energética. Todos os países desenvolvidos têm.”

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