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Um seleto grupo de brasileiros integra a colaboração internacional de cientistas que conseguiu, em 14 de setembro de 2015, captar a primeira onda gravitacional com um equipamento chamado interferômetro. A descoberta rendeu o Nobel de Física em 2017 ao trio de cientistas que assinou a construção do Observatório da Interferometria Laser de Ondas Gravitacionais (Ligo, na sigla em inglês), capaz de captar o choque entre dois buracos negros a 1,4 bilhão de anos-luz. Esses tinham 29 e 36 vezes a massa do Sol, maior astro do sistema solar, responsável por 99,86% de sua massa e equivalente a 333 mil vezes a massa da Terra.

O choque produziu um novo buraco negro com 62 massas de sol e as ondas gravitacionais que foram detectadas primeiramente pelo equipamento instalado em Livingston, na Louisiana, no sul dos Estados Unidos, e, sete milésimos de segundos depois, no outro Ligo, localizado em Hanford, Washington, ao norte do mesmo país. Um terceiro equipamento entrou em operação em agosto de 2017, próximo da cidade de Pisa, na Itália, o Virgo.

Depois da primeira detecção, ocorreu outra ainda em 2015, também com buracos negros. Em 2017, quando o equipamento voltou a ser ligado, foram quatro fenômenos detectados, sendo o último a colisão de duas estrelas de nêutrons, com massa e distância menores – a 130 milhões de anos-luz. Os equipamentos ficaram ligados em dois períodos: observação 01, entre setembro de 2015 e janeiro de 2016, e 02, após melhoramentos, de 30 de novembro de 2016 a 25 de agosto de 2017.

“Quanto mais equipamentos houver, mais precisa será a localização da origem das ondas e qual o formato delas, o que proporciona maior conhecimento científico. Essas primeiras ondas vieram de baixo, do chão, até o interferômetro. Tinham entrado pelo polo sul do planeta Terra”, conta o engenheiro eletrônico Odylio Aguiar, que coordena os estudos sobre ondas gravitacionais no Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Foi ele quem em 2011 levou o projeto brasileiro para a construção de um sistema de isolamento vibracional para o Ligo, invenção do Inpe que consiste em um sistema de cilindros aninhados um dentro do outro.

Um interferômetro tem dois tubos de vácuo perpendiculares com diâmetro de cerca de 1,20m, com quatro quilômetros de distância cada um. Em cada uma das pontas dos tubos estão suspensos espelhos, que medem as ondas, protegidos pelo sistema de isolamento vibracional brasileiro. Um laser que percorre os tubos de vácuo é dividido em dois, indo cada um para um tubo. Todos os fótons nessa luz têm a mesma fase. Se ajustar as distâncias dos espelhos, é possível fazer com que, na volta do laser, um feixe junte com o outro com fase trocada. Quando isso ocorre, cancela-se a luz. “Então o detector fica ajustado para essa situação sem luz. Se a onda gravitacional chega, ela modifica as distâncias entre os espelhos e aí você quebra essa condição de cancelamento da luz. Com isso, ocorre emissão de luz detectada por um sensor”, explica Aguiar. Ele lembra que se trata de movimento minúsculo: “O sistema consegue detectar se um espelho se mexeu em relação ao outro a partir de um movimento mínimo, algo 10 mil vezes menor que o diâmetro de um próton.”

Rumo ao futuro

Foi Albert Einstein quem criou a teoria das ondas gravitacionais, em 1915, juntamente com a teoria da relatividade geral, baseada na mecânica de Isaac Newton (de 1660), pai da teoria da gravidade, modificando-a. Hoje essa teoria é base de toda a cosmologia moderna que explica a constante expansão do Universo e os buracos negros.

Enquanto Newton teorizou que há uma força gravitacional entre dois corpos obedecendo a uma lei da gravitação, sendo essa força algo misterioso, Einstein mudou essa ideia, acrescentando que qualquer força teria uma velocidade limite, a da luz, percebendo que tempo e espaço estavam conectados, introduzindo o conceito de espaço-tempo.

Com a teoria da relatividade geral, Einstein percebeu que o espaço-tempo pode se curvar com a ação de uma massa, produzindo uma força gravitacional. Essa deformação no espaço-tempo é que são as ondas gravitacionais. “Para entender melhor, é como se você colocasse uma bola de boliche no meio de uma cama de borracha. Ela vai deformá-la. A cama de borracha é o espaço-tempo e a bola de boliche é o sol. Uma bola de bilhar poderia ser equivalente ao peso de um planeta. Eles sentem a atração para a bola de boliche não porque existe uma força invisível, a do Newton, mas sim porque eles sentem o espaço-tempo sendo deformado em torno da bola”, justifica o físico.

Os benefícios dessa descoberta ainda são imensuráveis. O que hoje parece “coisa do futuro” poderá se tornar realidade, como veículos controlados por gravidade, sem a necessidade da propulsão de um foguete; detectar outras dimensões, além das conhecidas atualmente. “Se formos capazes de produzir artificialmente as ondas gravitacionais, poderemos tentar comprovar a teoria do buraco de minhoca, que consiste em um atalho entre espaços físicos difíceis de serem transpostos, como Terra e Marte. Em tese, as ondas viajariam nessas outras dimensões também onde deixariam focos de energia. Isso ainda vai demorar, mas certamente é uma nova linha de pesquisa que vai revolucionar as leis da física.”