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O setor da mineração no Brasil tem sido marcado pela polêmica relativa às questões ambientais, seja pelo impacto causado pela atividade ou pelo seu avanço em áreas de proteção.

Exemplos emblemáticos são o decreto, revogado pelo governo em 25 de setembro último após inúmeras críticas, que extinguia a Reserva Nacional do Cobre e Associados (Renca) e a tragédia ocorrida na cidade mineira de Mariana. Em 2015, o rompimento de uma barragem de rejeitos minerais da Samarco deixou 18 mortos, um desaparecido, 504 desabrigados, 308 desalojados no município e um rastro de destruição ambiental que chegou ao estado do Espírito Santo.

O debate sobre a segurança e importância da atividade para a economia nacional segue em torno das três Medidas Provisórias (789, 790 e 791), editadas em julho e ainda não apreciadas pelo Congresso, que compõem o novo marco regulatório em substituição ao Código de Mineração, de 1967. O vice-presidente do Sindicato dos Engenheiros no Estado de Goiás (Senge-GO) e presidente em exercício do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia (Crea-GO), o geólogo Wanderlino Teixeira de Carvalho, acredita que a matéria tem aspectos positivos, como a criação da Agência Nacional de Mineração (ANM) em substituição ao Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), hoje vinculado ao Ministério de Minas e Energia. “É um texto razoável”, avalia. Mas aponta algumas incongruências: “Tem um dispositivo que impede a indicação de excelentes profissionais – como engenheiros e geólogos – para comporem a diretoria da nova agência reguladora só por terem sido dirigentes sindicais.” Ele se refere ao artigo 12, inciso III, da MP 791, que expressamente veta a indicação de nomes que já tiveram atuação sindical. Já o artigo 81 da MP 790 responsabiliza criminal e administrativamente os geólogos e os engenheiros de minas, em suas atividades profissionais. “Mais uma barbaridade”, é taxativo.

Desmistificar a atividade
“A mineração não é uma atividade perigosa. Ela tem riscos se mal conduzida por parte das empresas, como foi o caso de Mariana”, argumenta o professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), o geólogo Antonio Pedro Viero. A posição é endossada por Carvalho: “Essa tragédia não constituiu uma falha da legislação minerária e ambiental. Ela ocorreu por falta de fiscalização adequada, da União (DNPM), do governo estadual e do próprio município.”

O professor gaúcho salienta que a mineração é uma atividade imprescindível à sociedade moderna. “Ela está presente em todos os setores. Se a eliminarmos, deixaremos de construir qualquer tipo de obra civil – edifícios, residências, pontes, portos, aeroportos, estradas –, de produzir uma série de insumos que estão em produtos que usamos no dia a dia, desde uma caneta, telefone celular, computador até o carro. Tudo isso tem mineração por trás. Até na produção de alimentos.” Assim, ressalta que existem tecnologias e métodos que tornam a atividade bastante segura, “desde que conduzida com rigor técnico e sempre com a presença de profissionais qualificados e habilitados”.

Na legislação de 1967, explica Viero, não se falava em meio ambiente. “Mas agora ele é mencionado no artigo 7º da MP 790, quando diz que o exercício da atividade inclui a responsabilidade do minerador pela recuperação ambiental das áreas impactadas”, registra. Segundo ele, pequena menção já é suficiente, porque o País tem legislação ambiental muito completa e abrangente.

Carvalho segue o mesmo raciocínio, afirmando que é desnecessário a introdução desse tema no marco legal da atividade, pois se deve “considerar o arcabouço jurídico existente na Constituição Federal e na legislação ambiental”. Já em relação à segurança das populações no entorno das barragens de rejeitos de mineração, há também legislação específica que as mineradoras são obrigadas a obedecer. Todavia, ele critica o que classifica como “a péssima fiscalização”. Ele lamenta as fiscalizações esparsas na quantidade e insuficientes em relação à qualidade empregada. “Exceção à regra é uma raridade, o que não constitui culpa da legislação em vigor, mas sim do poder público.”

Operação mais custosa
O professor Viero avalia que o novo marco regulatório, ao aumentar as alíquotas da já existente Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (CFEM) e criar a Taxa de Fiscalização de Atividades Minerais (TFAM), vai restringir a participação das pequenas empresas no setor e favorecer os grandes grupos. Apesar disso, o especialista aponta uma mudança favorável que deve evitar a atual especulação imobiliária de áreas minerárias. Ele explica: “Pelo código de 1967, quem conseguisse o título minerário tinha de um a três anos, podendo prorrogar por igual período, para fazer a pesquisa e confirmar ou não o potencial do local. Mas acontecia que se o relatório de pesquisa não fosse apresentado, a área era disponibilizada outra vez para o mesmo procedimento. Assim, a área ficava décadas e décadas sem ter qualquer pesquisa e aproveitamento.”

No novo marco, o período de pesquisa vai de dois a quatro anos, sem renovação. Ao término disso, explana Viero, se o detentor do título não entregar o relatório ou se esse não for aprovado por deficiência técnica, a área não fica livre para novos requerimentos, mas vai a leilão. Porém, a medida também traz pontos duvidosos, infere o professor. “Como o leilão tem como único critério o valor oferecido, não importando a capacidade técnica e econômica, o histórico e o acervo técnico da empresa, acaba-se criando uma situação perigosa”, enfatiza, e acrescenta: “Além de também alijar as pequenas empresas do processo.”

Tramitação
As MPs 789, 790 e 791 serão analisadas, separadamente, em comissões mistas de deputados e senadores. Depois, passarão por votações nos plenários da Câmara e do Senado. Elas produzem efeitos imediatos, mas dependem de aprovação do Congresso Nacional para transformação definitiva em lei. Seu prazo de vigência é de 60 dias, prorrogáveis uma vez por igual período.